quinta-feira, 23 de abril de 2009

"Só por hoje"





Maços de Carlton no lugar da pessoa amada. Será possível substituir um vício por outro?


Aderi ao tabagismo no pior momento possível. O governo resolveu aumentar os impostos sobre o produto, os maços estão estampados com fotos chocantes, leis antifumo rigorosíssimas querem abolir o cigarro até dos bares e os ex-fumantes estão por toda parte fazendo seus sermões. De todos esses fatores, apenas o preço do cigarro me incomoda. Com relação às fotos chocantes, a única que me causa mal estar é a do cadáver de um rato, acompanhado por duas baratas mortas. As demais, que mostram seres humanos sofrendo, não me sensibilizam muito. Quanto às leis, por enquanto estão restritas a São Paulo, mas mesmo que o Rio de Janeiro resolva adotá-las, meus hábitos não precisarão se modificar, pois costumo me isolar para fumar e não incomodo ninguém.

Dentre os motivos que me levaram a fumar, estão a necessidade de ter uma muleta emocional, o desejo de autodestruição e, principalmente, a tentativa de colocar este vício no lugar de outro. Sempre senti a necessidade de me isolar, mas alguém no canto com cara de triste é algo que chama atenção, é quase um convite para a abordagem de gente que supostamente se preocupa em saber o que você tem. Um cigarro na mão, e pronto: todos entendem que você se isolou para fumar e não cobram maiores explicações sobre seu estado de espírito, no máximo podem ensaiar uma censura sobre o tabagismo.

Fumar é também uma boa alternativa para quem, como eu, gostaria muito de abreviar sua vida, mas não tem coragem de cometer suicídio. O que é mais chocante para os pais, encontrar o cadáver de seu filho com um tiro na cabeça ou vê-lo adoecer? Seguramente, ver seu cadáver em estado lamentável. Assim, me satisfaço prejudicando minha saúde de forma lenta para poupar meus pais de uma visão mais chocante.

Mas por que, só tardiamente, resolvi fumar? Desde os 17 anos sofro de depressão e só aos 26 experimentei os primeiros cigarros. Ou seja, se fosse tão somente o desejo de autodestruição, já estaria fumando há mais tempo. O fato é que minha principal motivação foi um amor desfeito.

Nada mais semelhante ao vício do que o estado lamentável em que o cérebro de uma pessoa apaixonada se encontra. Infelizmente, meu cérebro está nesse estado lamentável desde 2007, quando conheci Alan. Nossa relação foi bastante intensa, a tal ponto que trocávamos uns 3 emails por dia e, mesmo quando passávamos o dia inteiro juntos, isso não era suficiente. Lembro-me de ficar com Alan até umas 2 da manhã, mas a primeira coisa que fazia quando chegava a minha casa era acessar a Internet para conversar com ele, mesmo que já passasse das 3 da madrugada. Ele também relatava que mal chegava do trabalho e já ia correndo pra Internet, às vezes nem jantava, tudo porque gostava de conversar comigo.

Tudo isso mudou quando Alan chegou à conclusão que não valia mais a pena arriscar seu casamento. Primeiro, cessaram os telefonemas, mas continuaram as mensagens de celular; depois, cessaram as mensagens, cessaram os encontros, nosso contato ficou cada vez mais reduzido, não fosse por um porém: continuávamos viciados em conversar pela Internet. Quantas madrugadas viramos conversando! Quantas esperanças em suas palavras de que em breve voltaríamos a nos encontrar! Mas, também a Internet estava com seus dias contados. Com a esposa policiando cada passo seu, Alan não podia mais ficar grudado no computador como antes. E passou a adotar intervalos cada vez maiores para as nossas conversas. Quantas vezes fiquei em frente ao computador esperando, em vão, ele ficar on line! Meu sofrimento assemelhou-se, e muito, ao sofrimento de alguém que é forçado a largar um vício.

Meses se passaram e por inúmeras vezes tentei cortar qualquer contato com ele. Eu dizia “acabou, nunca mais vou conversar com você, vou te excluir, te bloquear”, mas no dia seguinte lá estava eu no MSN, adicionando-o novamente... e o pior é que ele não colaborava e quase sempre estava on line. Mas chega uma hora que tudo cansa, e eu cansei das falsas promessas, cansei de ouvir palavras vazias, cansei de receber telefonemas da esposa dele me dizendo baixarias. Foi, então, que deletei a conta de email que usava para conversar com ele e prometi a mim mesma que não voltaria a procurá-lo.

Como tem sido minha vida desde que fiz isso? Péssima. Sinto saudade? Sim, muita. Foi aí que comecei a fumar, para preencher o vazio que ele deixou, para substituir meu vício por ele pelo vício no cigarro, para tentar me autodestruir, preferindo sentir a dor de uma doença a ter que sentir a dor de mais um relacionamento desfeito em minha vida.

É possível substituir um vício por outro? Minha amiga diz que não, que os vícios tendem a se acumular, e não a sair de cena para dar lugar a outros. O fato é que já estou há 50 dias sem ter qualquer contato com Alan. Mas, assim como dizem os frequentadores dos Alcoólicos Anônimos, é só por hoje.

3 comentários:

  1. Acho que vc não deveria fumar, mas também não acredito que isso vai te matar. Só que não tem muito sentido porque quando você fuma, inevitavelmente, relaciona com o motivo que te faz fazer isso. Adianta? Você esquece? Não.
    Se fumar é gostoso, ótimo. Mas se for só para ajudar a seguir em frente, recomento outras formas mais perfumadas...Te adoro!

    ResponderExcluir
  2. Putz! A Roberta, em 6 linhas, foi mais eficiente na argumentação do que eu em uns 20 textos...

    ResponderExcluir
  3. Meeeeeu deus...tô me identificando demais com seus posts...esses dias escrevi um post enorme relacionando o meu 'problema amoroso'(que se chama Arthur) ao vício, à luta que existe todos os dias pra continuar. Me sinto como uma adicta tbem, lutando contra esse vício um dia de cada vez. Só por hoje :)

    Bruna,
    bruna.ms@gmail.com

    ResponderExcluir